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Diversidade da videira

29/05/2013, Profº Antero Martins - (ISA)
Diversidade da videira

A diversidade genética das videiras autóctones portuguesas situa-se essencialmente em 3 compartimentos.

A diversidade genética das videiras autóctones portuguesas situa-se essencialmente em 3 compartimentos: a variabilidade dita intervarietal, no seio da Vitis vinifera sativa (cultivada), comumente entendida pelo conjunto das diferentes castas; a variabilidade dita intravarietal, também no seio da Vitis vinifera sativa, mas especificamente compreendida no seio de cada casta; e a variabilidade ao nível da Vitis vinifera silvestris, sub-espécie não cultivada e existente na flora silvestre.

O compartimento intervarietal é composto por aproximadamente 250 castas autóctones, o que constitui um dos mais importantes parques varietais entre os grandes países vitivinícolas.

Na verdade, ainda que a Espanha, França e Itália disponham de parques de castas autóctones com efectivos da mesma ordem de grandeza, tendo em conta a menor superfície global (e vitícola) de Portugal, podemos concluir que aqui a densidade de castas autóctones é várias vezes superior às daqueles países. Os trabalhos de prospecção actualmente em curso no seio da PORVID fazem-nos acreditar que existirá um número significativo de castas a acrescentar
às actualmente reconhecidas.

Este compartimento da diversidade tem vindo a ser valorizado desde os anos 80, principalmente pelo reconhecimento ampelográfico e molecular, por parte de organismos oficiais, como os antigos IGEF, INIA/EVN e outros, e pela descoberta do respectivo valor enológico, por parte das empresas vitivinícolas. Actualmente, existe uma Colecção Ampelográfica Nacional no INIAV / Dois Portos
(em curso de renovação) e cerca de uma dúzia de colecções
ampelográficas de índole regional, incluindo algumas privadas.

O compartimento intravarietal contém a matéria-prima para realizar a selecção e para adaptar a casta ao gosto flutuante dos consumidores, aos objectivos da indústria do vinho, às ameaças bióticas e abióticas sobre a cultura e às exigências crescentes da defesa do ambiente. Trata-se de variabilidade das chamadas características quantitativas, como rendimento, ou açúcar, acidez, antocianas no mosto, isto é, características não directamente observáveis à vista, mas com enorme importância cultural e enológica. E não se pense que, por não serem observáveis à vista, as diferenças dessas características dentro da casta são menos profundas: na verdade, o que se passa é bem o contrário, pois dentro de castas como o Arinto, ou Viosinho, ou tantas outras, podem existir plantas (genótipos) com potencial genético de eendimento 10 vezes maior do que o de outras e com potencial de açúcar duplo do de outras!

São essas diferenças que, analisadas com instrumentos matemáticos adequados (porque a observação directa tem reduzida eficácia), nos permitem fazer a selecção massal e clonal com ganhos muito substanciais, traduzidos em importantes mais-valias económicas para os viticultores e para o país. O ganho com o material policlonal resultante da selecção efectuada em 60 das mais importantes
castas, ao nível do rendimento, foi superior a 15%, o
que representa um valor médio da ordem de 15 milhões de euros, anuais, para a fileira vitivinícola!

O último compartimento compreende as videiras silvestres. Estas são as plantas que já existiam desde muito antes de haver viticultura e que continuam a existir, geralmente em pequenos núcleos, distribuídas desde a Península Ibérica até ao Cáucaso, de ambos os lados do Mediterrâneo. Encontram-se preferencialmente nas margens de rios e em depressões com humidade permanente, trepando por tutores vivos arbóreos à procura do sol.

As videiras silvestres começaram a ser reconhecidas em Portugal em 1999, tendo então sido detectados cerca de 10 núcleos, sobretudo no Alentejo Centro-Oriental. A partir de 2009 foram descobertos cerca de outros 130 novos núcleos, alguns deles configurando uma área de distribuição contínua de centenas de quilómetros quadrados (bacias hidrográficas do Sado e do Guadiana), situação aparentemente sem paralelo nas Europa e Eurásia.

O interesse das videiras silvestres resulta, desde logo, de se tratar de uma espécie à beira da extinção, cuja preservação contribuirá para a valorização do território e interessará a toda a Sociedade. Para o sector vitivinícola, as videiras silvestres representam as raízes mais recuadas do vinho, reforçando assim a respectiva vertente cultural e podendo sustentar diversas acções e promoção do mesmo, ao nível das rotas do vinho, e do enoturismo em geral.